Baseio-me sobre algumas reflexões e alguns comentários que apareceram nos últimos dias nos Social Networks para aprofundar algumas temáticas para mim importantes e que já não posso ignorar.
Nos últimos dias foi publicada uma entrevista a um emprendedor vitivinícolo que apoia os vinhos naturais. Nesta entrevista ele expressou dissidência sobre os produtores de vinhos naturais que vêem nos defeitos organolépticos um símbolo distintivo da sua naturalidade e territorialidade.
Ao mesmo tempo, defendendo a boa gestão da adega, expressou o seu desapontamento com aqueles que usam leveduras selecionadas e / ou vários adjuvantes na vinificação.
O que o artigo publicado queria, de alguma forma, era apoiar a ideia que o defeito, bem como o uso de adjuvantes e aditivos, altera a originalidade dum vinho e o seu vínculo com o território. Este ponto de vista, entre os menos extremos em circulação, está a tornar-se o tema dominante entre muitos enologos entusiastas, aos quais adicionam-se enganosos especialistas que alimentam a dissidência questionando os emprendedores vitivinícolos e enólogos.

Tentamos esclarecer esta questão.

Nos meus 30 anos como enólogo consegui aprofundar as técnicas de produção de vinhos produzidos a partir de uvas cultivadas em Agricultura Biológica, Biodinámica ou Agricultura convencional; sobre vinhos produzidos sem a adição de sulfitos, sem o uso de leveduras selecionadas, sobre os chamados vinhos “industriais” e sobre vinhos comercializados com sedimentos em garrafa. Penso ter feito uma boa experiência, mas não me sinto satisfeito. Ao contrário, sou tão apaixonado por esse trabalho que continuo a ler e a estudar porque ainda há muitas lacunas que a ciência não consegue explicar, no aprofundamento dos aspectos químico da fermentação e da conservação dos vinhos.
Sofro a ver criminalizar a Enologia em geral por parte de pessoas que de Enologia não percebem nada. Como enólogo estou feliz quando dizem que entre os produtores de vinhos naturais são reconhecidos os defeitos como algo que não expressa um território, mas sim que o degrada. Muitos, no entanto, os celebram e os tornam um ponto forte para descobrir novas estrelas nascentes. O defeito, como diz um famoso colega, é identificável em todos os lugares; portanto, além de ser degradante, também é um homologante.

Estas temáticas não são novas: ao longo dos anos foram divinizados vinhos que um produtor engarrafava sem qualquer controle, assim podias comprar ou encomendar uma garrafa que tinha feito maloláctica em garrafa ou que era refermentada por algum açúcar residual mal considerado: não era permitido avançar nenhuma crítica porque a consequência era ser marcado como bárbaro e ignorante; paradoxo dos paradoxos.
Embora eu concorde em reconhecer que os defeitos são defeitos, não posso compartilhar o conceito que um vinho, para ser original e se identificar num território, deve ser produzido sem o uso de adjuvantes e / ou aditivos. Reconheço que nos vinhos de massa é um uso comum e, em alguns casos, dos quais me afasto, é um uso exagerado. Se, no entanto, alguém tentasse aprofundar estes temas, o ABC da Biologia, da Química e de todos os fenómenos que estão à base das transformações que nos levam a obter um vinho, se calhar, estaria mais disposto a reconhecer que o motor biológico que nos permite vinificar deve ser guiado pelo homem. A evolução natural das uvas, de facto, é a de reproduzir, partindo duma semente, uma outra videira: o vinho é um produto regulado, desejado e conduzido pelo homem.
Em natureza não existe, excepto num curto intermédio durante o processo de deterioração biológico da uva.
As uvas produzidas numa vinha localizada num determinado território fazem a única diferença. A videira autóctone é um elemento a mais, mas apenas quando bem selecionada.

O uso de leveduras selecionadas, aquelas identificadas como rápidas e seguras activadoras da fermentação, o uso de bactérias malolácticas, se calhar obtidas a partir do armazenamento na adega no ano anterior, o uso de sulfitos em maneira correcta e não invasiva, não é o mal. O barrique e o recipiente de madeira nasceram para um propósito: refinar, limpar e estabilizar naturalmente o vinho; não o devem bronzear com um gosto de madeira!
Todas estas são técnicas e ferramentas que o homem desenvolveu ao longo dos séculos para melhorar e disponibilizar o vinho ao longo do tempo. Eu não vejo nada de errado nisso, pelo contrário, acho que é a maneira ideal para valorizar um vinho num território, desde que seja usada com o contributo duma viticultura cuidadosa e direcionada, numa ligação indissolúvel.
Este será o desafio do futuro para a Itália: emergir num mercado global, ligando os nossos vinhos aos seus territórios de produção e com eles unir a nossa história, o nosso património gastronómico e cultural. Hoje, mais do que nunca, é importante ter uma consciência comum para nos impor num mercado cada vez mais difícil e complexo. Reduzir o problema pensando que as leveduras selecionadas sejam um facto negativo está fora do tópico e contraproducente.
Se for verdade que foram escolhidas variedades de leveduras que caracterizam e generalizam o buquê dum vinho, também é verdade que existem muitas que são apenas bons fermentadores que não afectam as peculiaridades originais das uvas. A escolha é ampla. Pensemos apenas um pouco sobre o que seria hoje a produção de Champagne ou de Espumantes, de qualquer área do mundo, se não houvesse leveduras selecionadas: foram isoladas, catalogadas e reproduzidas, sem modificações genéticas, especificamente para atingir esse resultado sem desnaturar e, ao contrário, para melhorar os mesmos vinhos.
E que queremos dizer acerca da selecção “na cave” das levaduras chamadas “espontâneas” que fermentam os mostos destes produtores “naturais”: eles são microorganismos que vivem em quiescência nas adegas deles (não nas vinhas deles!), despertam-se ao contacto com os mostos e propagam-se ao longo da colheita e depois voltam a adormecer-se. Numa adega, não existe uma levadura única que começa e completa um processo fermentativo, nem aquelas selecionadas o podem fazer.
Por acaso, quem afirma o contrário já fez pesquisas microbiológicas para perceber quem são e qual origem têm as suas levaduras?
Eu posso dizer-lhes que se fisessem pesquisas sobre os mapas genéticos dessas cepas “Indígenas” descobririam que essas leveduras são também comercializadas e vendidas como bons vinificadores; encontrariam comuns Saccharomyces Cerevisiae, um microorganismo unicelular, um fungo, o agente da fermentação. Eles também encontrariam leveduras apiculadas, leveduras “não boas”, “perigosas”, não porque sejam monstros, mas porque em certas condições ambientais preferem comer outras coisas além de açúcares, e esse “outro” é um problema, um defeito 9 vezes em 10. Descobririam simplesmente que o que dizem não tem fundamento.

Como disse, tentei vinificar uvas e afinar vinhos sem usar sulfitos para várias colheitas. O resultado é que eles podem ser produzidos, mas com um resultado qualitativo sem personalidade. Para um efeito oxidativo, perdem-se os perfumes e os vinhos tornam-se insignificantes em comparação com os tradicionais. Até hoje não existe uma técnica que permita a produção de vinhos valiosos, especialmente no envelhecimento prolongado, sem o uso deste aditivo complexo que actua como anti-séptico, conservante e estabilizador. A que preço então? Porque se se quisesse evitar este uso, seria necessário usar outros aditivos como taninos, taninos e mais taninos. E quem seria então dos vinhos brancos sem o uso dos sulfitos: ajuda!

É verdade: os sulfitos adicionados são irritantes, tóxicos. Se usados com sabedoria, porém, não causam todos os problemas de que se fala. Os limites legais foram baixados nos vinhos nos últimos tempos e estão sujeitos a ajustes contínuos à medida que a experiência dos operadores cresce, mas por agora não é possível não os usarem.
Às pessoas que contestam este uso, gostaria de perguntar se eles compram ou comem crustáceos frescos, mostardas, picles, molhos em geral, etc. Perguntam-se quantos sulfitos adicionados existem na maioria das conservas? E quando se considera a dose máxima ingerível por quilograma de sulfitos, consideram-se aqueles ingeridos através de todos os alimentos? Muito fácil falar sem saber!
Porque devemos sempre pensar que a Pesquisa, o estudo e aqueles que tentam de aplicar o fruto deste trabalho sejam perigos para a saúde, terroristas especuladores que querem envenenar o próximo?
Eu sou um enólogo, o meu trabalho é aquele de valorizar ao máximo os vinhos dos meus clientes trabalhando sobre as peculiaridades das uvas que produzem num território específico. Eu uso poucos adjuvantes e só quando for necessário.
Apesar disso, não é possível encontrar uma identidade comum entre todos os vinhos com os quais trabalho, passando do Norte para o Sul da Bota e mesmo assim não penso ser um “Alquimista”: penso ser apenas um bom “Piloto” que usa as técnicas que a ciência disponibiliza
para fazer bem o meu trabalho.

Não só, sinto-me afortunado.

Muitos dos meus colegas não podem dizer a mesma coisa, porque no mercado do vinho não há só vinhos famosos, também há vinhos normais, aqueles que são bebidos todos os dias, como se bebe uma simples cerveja; porque também há um consumidor que às vezes quer beber apenas um bom vinho sem meditar se está a beber um Cabernet ou um Sangiovese. Existem consumidores inexperientes que precisam de educar o paladar bebendo vinhos simples para depois chegar a um vinho importante. Os vinhos simples não são venenos! São vinhos obtidos da Uva! Os seus mostos são vinificados com técnicas modernas e confiáveis, e se usam também adjuvantes e aditivos alimentares autorizados para obter vinhos “perfeitos”. E então?

Deveríamos deixar este Mercado? Deveríamos sugerir a milhares de operadores para mudar de emprego porque alguém que não conhece e não se informa acha que estão a fazer algo inaceitável?
Ou que eles estão a continuar um negócio contra a natureza?
Absurdo!

O vinho deve ser considerado em todas as suas variantes qualitativas e comerciais no País que é o principal produtor mundial.
Se a tecnologia nos permite conter os custos e ser competitivos, mesmo nos preços mais baixos, não há nada de errado com isso. Há espaço para todos no mercado e o nosso objetivo deve ser o de melhorar sempre. Fazer a guerra por um punho de leveduras parece-me uma maneira de querer procurar um bode expiatório que não responde às questões importantes.

Finalmente, sublinho que as minhas reflexões como profissional são principalmente uma mão amiga para aqueles que entram no mundo do vinho com paixão e competência com os quais não vejo a hora de me confrontar de forma construtiva.
Umberto Trombelli
Per la Traduzione si ringrazia: Marta Donadel di Amorim Italia

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